do Hinário O Cruzeiro do Mestre Raimundo Irineu Serra, comentado por Juarez Duarte Bomfim.
107. Chamei lá nas alturas
Chamei lá nas alturas
Para o Divino me ouvir
A minha mãe me respondeu
Oh filho meu, estou aqui.
Minha mãe, vamos comigo
Para sempre eterna Luz
Para eu poder assinar
Para sempre a Santa Cruz.
Esta cruz no firmamento
Que radeia a Santa Luz
Todos que nela firmar
É para sempre, amém, Jesus.
A história do recebimento deste hino pelo Mestre Raimundo Irineu Serra está relacionada à vida e morte (desencarne) de um outro mestre ayahuasqueiro: Daniel Pereira de Mattos, o Frei Daniel, fundador do Centro Espírita e Culto de Oração “Casa de Jesus Fonte de Luz” - A Barquinha, criado na década de 1940 na zona rural da cidade de Rio Branco-Acre, no seringal Santa Cecília, hoje bairro de Vila Ivonete.
Daniel Pereira de Mattos - o Frei Daniel - fundador da Barquinha.
De Daniel Pereira de Mattos sabe-se que ele nasceu em 13 de julho de 1888 numa antiga feitoria de escravos de nome São Sebastião de Vargem Grande no interior do Maranhão e que pertenceu a Marinha de Guerra Brasileira. Além disso, sendo homem bastante habilidoso, dele é dito que sabia desempenhar doze tarefas: foi construtor naval, cozinheiro, músico, barbeiro, alfaiate, carpinteiro, marceneiro, artesão, poeta, pedreiro, sapateiro e padeiro.
Ao fixar residência na cidade de Rio Branco-Acre, Daniel se notabilizou como um grande boêmio do bairro do Papôco, as margens do Rio Acre, zona de baixo meretrício e freqüentado por navegantes e boêmios em geral que por ali passavam.
Daniel fazia composições musicais que falavam de amor, paixão e busca pela mulher amada. Músicas que fluíam pelos seus dedos ao violão declarando paixão pela noite e pelas serenatas que embriagavam os homens de canções e cachaça.
Ao encontrar-se enfermo, com problemas de fígado, decorrente do abuso de álcool, passa a ser tratado e zelado pelo seu conterrâneo, Raimundo Irineu Serra, fundador da doutrina do Santo Daime. O tratamento teve início em 1936, sendo interrompido por Daniel quando se encontrou melhor de saúde. Voltou a beber e novamente doente, foi chamado pelo generoso e paciente amigo Irineu Serra para fazer um novo tratamento pelo restabelecimento da saúde física e espiritual.
Daniel se tornou discípulo do Mestre Irineu Serra, ficou conhecido como o “barbeiro do Mestre” e tocava violino nos trabalhos espirituais de Concentração instituídos por Irineu Serra.
Já residindo na colônia Custódio Freire, atual Vila Irineu Serra (Alto Santo) o Mestre Irineu para lá também transferiu os seus trabalhos. Ao término de uma Concentração, Daniel, cansado, voltando para casa, adormeceu a margem do igarapé São Francisco e teve um sonho, uma visão: a descida do céu de dois Anjos que, por ordem da Virgem da Conceição, lhe entregaram um Livro Azul e lhe falaram no cumprimento de uma missão.
Esta foi a “primeira morte” de Daniel Pereira de Mattos, quando dessa experiência e revelação renasce como místico e devoto de São Francisco das Chagas. A visão do Livro Azul por Daniel pode ser encarada como o primeiro ensinamento da doutrina que então surgia. Cada página deste livro foi e continua sendo instruções musicadas (salmos) recebidas e a cor do livro, o azul, representa o céu, de onde provêm revelações do nosso Pai de bondade, da Virgem Mãe Santíssima e dos Seres Divinos da Corte Celestial.
Os trabalhos espirituais com Daime do Mestre Daniel Pereira de Mattos tiveram a duração de doze anos (1946-1958). Daniel construiu uma casinha rústica de taipa e paus roliços, semelhante a uma pequena casa de seringal – a Capelinha de São Francisco. Lá ele recebeu os salmos de louvor e instruções provenientes dos planos sagrados – o Astral Superior. Neste espaço começou o trabalho de atendimento denominado “Obras de Caridade”. No início era procurado pelos seringueiros e caçadores da região junto com suas famílias. Pouco tempo depois, moradores da zona urbana de Rio Branco passaram a procurá-lo.
Daniel passou desta vida para a eternidade no interior da casinha de Feitio do Daime no dia 08 de setembro de 1958, às 18:30h, no início da romaria de São Francisco das Chagas. Seu corpo foi colocado no interior da igreja, sobre a mesa de concreto que ainda estava em fase de construção.
Chamei lá nas alturas
Para o Divino me ouvir
A minha mãe me respondeu
Oh filho meu, estou aqui.
Voltando a história do recebimento do hino 107 - Chamei lá nas alturas, pelo Mestre Raimundo Irineu Serra, conta-se que no dia do velório e enterro do Frei Daniel, dentro da própria Capelinha de São Francisco, foi durante o velório que o Mestre Irineu recebeu este hino, e o chamamento a entidades do Astral, comum a tradição ayahuasqueira, é aí uma invocação a Sempre Virgem Maria, que pressurosamente atende: “Oh filho meu, estou aqui”.
Esta cruz no firmamento
Que radeia a Santa Luz
Todos que nela firmar
É para sempre, amém, Jesus.
Na estrofe final, uma das mais belas imagens da cristandade se cristaliza nos versos desta canção e na superconsciência da miração: uma majestosa cruz luminosa envolvendo, no firmamento, o Nosso Senhor Jesus Cristo.
Ao término do enterro do Mestre Daniel Pereira de Mattos, o gigante Irineu Serra tendo ao seu lado a pequenina Percília Matos da Silva e os demais acompanhantes, voltaram para casa, nas terras sagradas do Alto Santo, cantarolando este hino, para ser apresentado a toda a irmandade.
Muito bom. Acredito ser interessante ressaltar qual a fonte oral que traz tal relato.
ResponderExcluirComo a História tem o seu valor !!!
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